terça-feira, 30 de julho de 2013

O Arcebispo e o agiota

Welby, o Arcebispo que declarou guerra aos juros altos
Na semana passada o Brasil não tirava os olhos da visita do Papa Francisco ao Rio de Janeiro. Aqui na Inglaterra, outro assunto de natureza, digamos, religiosa, também ocupou as primeiras páginas dos jornais. Enquanto o chefe da Igreja Católica desfilava pela orla de Copacabana, por aqui o comandante supremo da Igreja Anglicana (a principal ordem cristã do Reino Unido), Justin Welby, Arcebisbo de Canterbury, prometia fazer de tudo para tirar uma financeira do mercado.
Não foi uma simples promessa de púlpito. Welby, o equivalente anglicano ao Papa católico, declarou que vai financiar cerca de 500 cooperativas de crédito, com o objetivo de garantir empréstimos a taxas mais baixas aos seus fiéis e enfraquecer os negócios do Wonga, uma financeira virtual.
Welby foi direto. Em um encontro com o fundador e chefe-executivo do Wonga, Errol Damelin, na semana passada, o Arcebispo disse o seguinte: “Não estamos querendo legislar vocês para fora do negócio. Estamos tentando tirar vocês do mercado através da competição”.
A Igreja Anglicana já criou uma cooperativa de crédito para emprestar dinheiro ao próprio staff e a ideia é usá-la como base para ajudar as outras 500 cooperativas a se estabelecer. Se o Arcebispo tem poder de fogo? Na conta dele os anglicanos teriam 16 mil “postos de atendimento” (considerando seus templos), espalhados por 9 mil comunidades no Reino Unido.
Por que tanto barulho? Bom, o Wonga faz parte de um setor que vem ganhando terreno nos últimos anos com a crise econômica europeia – especialmente no Reino Unido -, as chamados pay day firms. Essas financeiras surgiram para ocupar um nicho de mercado cruel: financiar as pessoas que não conseguem fazer o salário chegar ao final do mês. Elas emprestam dinheiro a curto prazo e juros altos, mas quase sem burocracia.
O quanto é fácil fazer um empréstimo no Wonga? Assustadoramente fácil... Você entra no site (www.wonga.com) e desliza o cursor para selecionar quanto quer emprestado e por quanto tempo – automaticamente o site calcula as taxas e juros que você terá de pagar. Depois é só preencher um cadastro online, com seu endereço e dados bancários.
Simulação do empréstimo no site do Wonga
Até o limite de 400 libras (cerca de R$ 1.400), a aprovação do empréstimo leva cinco minutos. Esse é o tempo que demora para o dinheiro ser enviado à sua conta, a partir do momento em que você clica dizendo aceitar as condições do financiamento. O Wonga manda um e-mail ao cliente avisando que o valor está a caminho e, 15 minutos depois, a grana aparece disponível em conta. Ou seja, entre o clique final e o depósito do empréstimo na sua conta, passam-se 20 minutos.
Se os juros são altos? Fiz uma simulação (veja na imagem ao lado). Pegando 400 libras emprestadas por 30 dias, as taxas e juros somam 127,15 libras (R$ 445). Ou seja, no fim do empréstimo eu teria que devolver 527,15 libras (R$ 1.845), o que significa juros de 32% ao mês. Como comparação, os juros do cheque especial no Brasil estavam em 7,95% mensais em julho, segundo a Fundação Procon de São Paulo.
A intenção do Arcebispo de Canterbury parece nobre, mas o problema é que no dia seguinte o assunto ganhou uma nova camada de polêmica... Descobriu-se que a própria Igreja Anglicana tinha dinheiro investido no Wonga! Não é muito, cerca de 75 mil libras (R$ 262 mil) – quase nada perto dos 5,5 bilhões de libras (R$ 19,2 bilhões) que a instituição religiosa tem aplicados em uma série de negócios espalhados pelo mundo.
Welby não teve outra alternativa a não ser prometer maior rigor com os investimentos anglicanos. A igreja já tem um comitê de ética para estabelecer limites ao destino das próprias libras. As regras, que já existem, impedem colocar dinheiro em empresas que obtenham mais de 3% de sua receita total com o comércio de pornografia, mais de 10% de seus ganhos com produtos ou serviços militares e mais de 25% da renda com negócios relacionados ao jogo, álcool ou financeiras que emprestam dinheiro a juros considerados muito elevados.
É, na terra da rainha onipresente mesmo é o capitalismo...

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Ah, a infraestrutura...

Mapa do metrô londrino, artisticamente elaborado
Tá certo, não é só pelos 20 centavos. Mas o estopim para a avalanche de protestos no Brasil foi o reajuste da passagem de ônibus em São Paulo. Assim, por que não passar os olhos pela infraestrutura de transporte público que existe aqui na terra da rainha? Vamos a ela...
Comecemos por Londres, a capital. Comparações às vezes podem parecer maldosas, mas quase sempre acabam sendo esclarecedoras. A rede de metrô da cidade (que eles chamam carinhosamente de “tube”) começou a funcionar em 1890, um ano depois que o Brasil virou uma república. Hoje são 13 linhas, mais de 400 quilômetros de trilhos, 1,1 milhão de usuários por ano e 270 estações, tão próximas às vezes que desenhar o mapa do serviço exigiu a inspiração de um artista.
E São Paulo? Bom, a inauguração foi em 1974. São quatro linhas, 65 quilômetros e 58 estações, onde se espremem 877 mil pessoas por ano (números de 2012).
Em Londres o sistema é integrado, você compra um cartão magnético (o Oyster Card, que custa 5 libras, recuperáveis se você devolver o plástico) e o carrega com dinheiro, em vending machines ou nas bilheterias. A cada entrada das estações você aproxima o cartão ao leitor do lado da catraca e entra. Ao sair, faz o mesmo ao deixar a estação e o metrô debita do seu Oyster o valor equivalente à viagem (quando mais longe for, mais caro fica).
Se usar no sistema pay as you go (literalmente, “pague conforme o uso”, em que se carrega o cartão e ele fica imediatamente operacional), os valores variam de 1,50 a 5,70 libras por viagem, fora do horário de pico (sim, tem diferença de preço, o sistema é inteligente). Se vale a pena? Pagando a passagem separadamente as tarifas partem de 2,80 e podem chegar a 12,80 libras, a depender do trajeto percorrido.
Oyster Card em operação
Trens? Londres conta com 11 estações (nacionais e internacionais), que ligam a capital ao interior da Inglaterra, País de Gales, confins da Escócia ou o continente europeu, para quem tem medo de voar.
Pelo ar? Aí fica mais impressionante. A capital da rainha é servida por seis aeroportos (London City, Heatrow, Gatwick, Luton, Stansted e Southend), todos com voos nacionais e internacionais, e todos ligados à rede de transporte público - e não é só ônibus, não, estou falando de trem ou metrô.
Aeroportos de Londres - o Southend, a leste, não aparece
O maior deles é o Heatrow, onde chegam os voos vindos do Brasil, por exemplo. Nesse caso, há nada menos que quatro opções de transporte público para ir do aeroporto para a região central de Londres, adequadas à pressa e ao bolso de cada um.
A forma mais rápida (e cara) é o Heatrow Express. São quatro trens por hora que em 15 minutos te levam à estação de Paddington (bem central, fica a 500 metros do Hyde Park) – a viagem custa 18 libras. A segunda opção mais veloz é o Heatrow Connect, outro trem que deixa você na mesma Paddington Station, por 8,50 libras – partem a cada meia hora e o trecho leva 25 minutos.
Se quiser ir de ônibus, o National Express Airport te leva para a Victoria Station (central também, a 500 metros do St. James Park) por 5 libras – saem três por hora e a viagem leva 40 minutos, dependendo do trânsito.
A forma mais barata, mesmo, é tomar o metrô - a Piccadilly Line conecta a região central ao Heatrow, com trens partindo a cada cinco minutos, operando das 5h às 23h54. Com o Oyster Card, a viagem sai por 3,10 libras.
Britannia, o aeroporto flutuante, ainda em discussão
Mesmo com tudo isso eles não estão satisfeitos. Está em discussão por aqui a construção de um sétimo aeroporto na região leste de Londres, no estuário do Rio Tâmisa. E não é pequeno, não! Apelidado de Britannia, teria quatro pistas de pouso e decolagem, que ficariam suspensas sobre a água. O projeto prevê até a expansão futura, com possibilidade para mais duas pistas. O custo? Uns 60 bilhões de libras (algo na faixa dos R$ 200 bilhões).
Nas palavras do prefeito de Londres, Boris Johnson, à BBC: “Nós devemos nos manter competitivos, e para fazer isso precisamos de uma estratégia coerente para a Londres do século XXI”.
Enquanto isso, no Aeroporto Internacional de Barulhos...

terça-feira, 23 de julho de 2013

Nasceu!

Um pouco do centro de Derby
Sim, ele nasceu. Foram nove longos meses de expectativa e esforços diários para ver o sonho concretizado, com início em novembro do ano passado. Dúvidas, noites insones, ansiedade por respostas que nunca chegavam... Mas, finalmente, aqui está.
Não, não estou falando do filho do duque e da duquesa de Cambridge, o Príncipe William e a Kate Middleton. É desse blog que eu estou falando! Na verdade, mais do que do blog, do nosso projeto de passar um ano aqui no Reino Unido (mais exatamente nas East Midlands, em Derby, bem no meio da ilha). Tudo bem, o bebê também não é assunto que se despreze. Mas ele é só o terceiro na linha de sucessão e nem nome tem ainda...
Esse blog já nasceu nomeado: Crônicas do Reino. O objetivo está longe de ser ambicioso, apenas postar aqui as impressões de um brasileiro nas terras da rainha - acompanhadas de informações úteis e práticas para ajudar qualquer um que queira visitar ou entender melhor essa cultura sui generis. Não tenho uma periodicidade definida para as postagens, mas pretendo trazer novidades para vocês sempre que valer a pena (pra quem vai ler, claro).
Como eu dizia, foram longos nove meses de luta contra a burocracia britânica – e rapaz, eles são bons nisso... Mas na batalha do homem contra os burocratas, o homem venceu! Com os vistos na mão, a Fabi e eu temos planos de ficar por aqui até junho de 2014.
Para quem ficou curioso sobre o herdeiro real, ele nasceu ontem (claro que vocês já sabem). E é óbvio que a realeza não ia perder a chance de potencializar seu tempo de mídia anunciando o nome do menino logo em seguida – ou mostrando o bebê ao público assim tão rápido. Pior para os jornalistas que estão fazendo a cobertura na frente do hospital ou no Palácio de Buckingham, porque depois de uma semana de calor tropical a chuva britânica voltou com vontade. E, segundo a BBC, a expectativa é que o casal deixe a maternidade às 18h de hoje (horário local, quatro horas a mais que em Brasília) ou só amanhã de manhã...
Quanto ao nome, nas bolsas de apostas o favorito é George (o santo padroeiro dos ingleses, ele mesmo, nosso conhecido São Jorge), seguido de James, Alexander, Louis e Henry. George paga dois pounds para cada um que for apostado, James garante quatro para um, Alexander vale oito para um, Louis entrega 11 para um e Henry é o azarão, 12 para um.
Meu palpite? Eu aposto que vão ser 12 meses bem divertidos...